RAZÕES
PARA ESCREVER POESIA
Então
vi meus pais. Lembro claramente. Ela nos observava brincar detrás da
janela. Ele via um programa de televisão que alternava com a leitura
do jornal. Não estavam mortos. Eram, isso sim, muito jovens (mais do
que eu sou agora) e fazia um calor inquietante e úmido como sempre
são os verões do trópico. Uma vez a vi no chuveiro através do
olho da fechadura. Oh como me lembro de seus seios balançando
lentamente debaixo da água fria, o tênue esvoaçar dos morcegos, o
angustioso coaxar dos sapos e das rãs. De repente, o golpe seco e
definitivo de meu pai. Na verdade, não lembro se me deu ou não um
golpe. Só sei que possuí por um instante a beleza. E que nesse
instante a perdi para sempre.
RAZONES
PARA ESCRIBIR POESÍA
Entonces
vi a mis padres. Lo recuerdo claramente. Ella nos miraba
jugar detrás de la ventana. Él veía un programa de televisión que
alternaba con la lectura del periódico. No estaban muertos. Eran,
eso sí, muy jóvenes (más de lo que yo soy ahora) y hacía un calor
inquietante y húmedo como corresponde a los veranos del trópico.
Una vez la vi bañarse a través del ojo de la cerradura. Oh cómo
recuerdo sus pechos temblando lentamente bajo el agua fría, el tenue
aletear de los murciélagos, el angustioso croar de los sapos y las
ranas. De pronto, el golpe seco y definitivo de mi padre. En verdad
no recuerdo si me dio o no un golpe. Sólo sé que poseí por un
instante la belleza. Y que en ese instante la perdí para siempre.
O
MILÊNIO ESTÁ PRESTES A SE ACABAR
Mas
as estações ainda funcionam, a terra continua girando e os peixes
abrem e fecham suas bocas como o fazem há séculos. Em algum lugar
da Índia, os tigres machos lutam entre si pelo amor das tigresas e
em um bosque próximo os coelhos devoram as mesmas plantas e raízes
que alimentam a terra. Deveria falar da contaminação e do petróleo,
deveria falar das pragas inomináveis, da fome que devasta
populações, das crianças mutiladas pelas nuvens radioativas. Mas
estou aqui, escrevendo este poema, medindo suas palavras, elegendo-as
com amor e cuidado, com cólera e ressentimento. Então me olho no
espelho e só vejo trevas, um vazio culpável na página em branco.
Escrevo
isto porque me sinto só. Porque as palavras me abandonaram. Porque
ela não estará mais.
EL
MILENIO ESTÁ A PUNTO DE ACABARSE
Pero
las estaciones todavía se cumplen, la tierra continúa girando y los
peces abren y cierran sus bocas como hace siglos. En algún lugar de
la India los tigres machos luchan entre sí por el amor de las tigres
hembras y en un bosque cercano los conejos devoran las mismas plantas
y raíces que alimentan la tierra. Debería hablar de la
contaminación y del petróleo, debería hablar de plagas
innombrables, del hambre que devasta poblaciones, de niños mutilados
por nubes radioactivas. Pero estoy aquí, escribiendo este poema,
midiendo sus palabras, eligiéndolas con amor y cuidado, con cólera
y con resentimiento. Entonces me miro en el espejo y sólo veo
tinieblas, un vacío culpable en la página en blanco.
Escribo
esto porque me siento solo. Porque las palabras me han abandonado.
Porque ella no estará más.
CENA
PARA UM FILME
Como
alguém dirige suas lembranças? Eu tenho
várias que se
alternam e, para o cúmulo, variam
com o tempo. Não são organizadas. Um belo
dia aparecem e tcham! se instalam sem permissão
pedindo alguma música, se é possível
alguma explicação. Ontem, por exemplo,
tinha sete anos e entrei sem bater no quarto
da minha mãe. A janela dava a um enorme
jardim onde brincava o collie, no fundo
renascia uma palmeira, uma florescente árvore
de mamão papaia. Mamãe pintava as unhas
dos pés. Parecia estar muito concentrada
e apenas me notou. «Por que você se pinta? »,
perguntei. «Porque hoje chega seu pai», me
disse. E isso foi tudo. Não. Isso não foi tudo.
Seu vestido pendurava impaciente em uma cadeira
e uma câmera filmava suas pernas (a
esquerda escolhida, a direita ligeiramente
levantada). Que queria de mim essa lembrança?
Não sei. Se lhe pergunto, dirá que não havia
nenhum collie. Que talvez tivesse sonhado.
com o tempo. Não são organizadas. Um belo
dia aparecem e tcham! se instalam sem permissão
pedindo alguma música, se é possível
alguma explicação. Ontem, por exemplo,
tinha sete anos e entrei sem bater no quarto
da minha mãe. A janela dava a um enorme
jardim onde brincava o collie, no fundo
renascia uma palmeira, uma florescente árvore
de mamão papaia. Mamãe pintava as unhas
dos pés. Parecia estar muito concentrada
e apenas me notou. «Por que você se pinta? »,
perguntei. «Porque hoje chega seu pai», me
disse. E isso foi tudo. Não. Isso não foi tudo.
Seu vestido pendurava impaciente em uma cadeira
e uma câmera filmava suas pernas (a
esquerda escolhida, a direita ligeiramente
levantada). Que queria de mim essa lembrança?
Não sei. Se lhe pergunto, dirá que não havia
nenhum collie. Que talvez tivesse sonhado.
ESCENA PARA UNA PELÍCULA
¿CÓMO MANEJA uno los recuerdos? Yo tengo
varios que se alternan y, para colmo, varían
con el tiempo. No son organizados. Un buen
día aparecen y ¡zas! se instalan sin permiso
reclamando alguna música, si es posible
alguna explicación. Ayer, por ejemplo, tenía
siete años y entré sin llamar al dormitorio
de mi madre. La ventana daba a un amplio
jardín donde jugaba el collie, al fondo
renacía una palmera, un floreciente árbol
de papayas. Mamá se pintaba las uñas
de los pies. Parecía estar muy concentrada
y apenas me hizo caso. «¿Por qué te pintas?»,
pregunté. «Porque hoy llega tu papá», me
dijo. Y eso fue todo. No. Eso no fue todo.
Su vestido colgaba impaciente de una silla
y una cámara filmaba sus piernas (la
izquierda recogida, la derecha ligeramente
levantada). ¿Qué quería de mí ese recuerdo?
No lo sé. Si le pregunto dirá que no había
ningún collie. Que tal vez había soñado.
MARIONETES
DESDE
CRIANÇA que gosto de desenhar marionetes.
Assim me entretenho quando estou entediado,
quando ninguém me nota, quando espero
impaciente o menu do restaurante.
Alguns têm nome próprio, bichos
que apenas sobrevivem no traço, na
vida curta que o papel lhes concede.
Eles me acompanham. Chamam à porta
a qualquer hora, e eu sempre os recebo.
Levo a qualquer parte uma caneta, não vá
ser que os escute e não tenha como
dar-lhes forma. Não me pedem nada em troca.
Eles dançam felizes em toalhas de mesa, boletos,
guardanapos, e logo – assim como chegaram –
se despedem. As pessoas acreditam que a caneta
é para anotar versos, esboços misteriosos
que só ocorrem ao poeta. Não sabem que
nunca escrevo esboços, que as marionetes
me visitam quando soa a música
do mundo. E eu não posso escutá-la.
Assim me entretenho quando estou entediado,
quando ninguém me nota, quando espero
impaciente o menu do restaurante.
Alguns têm nome próprio, bichos
que apenas sobrevivem no traço, na
vida curta que o papel lhes concede.
Eles me acompanham. Chamam à porta
a qualquer hora, e eu sempre os recebo.
Levo a qualquer parte uma caneta, não vá
ser que os escute e não tenha como
dar-lhes forma. Não me pedem nada em troca.
Eles dançam felizes em toalhas de mesa, boletos,
guardanapos, e logo – assim como chegaram –
se despedem. As pessoas acreditam que a caneta
é para anotar versos, esboços misteriosos
que só ocorrem ao poeta. Não sabem que
nunca escrevo esboços, que as marionetes
me visitam quando soa a música
do mundo. E eu não posso escutá-la.
MONIGOTES
DESDE NIÑO me gusta dibujar monigotes.
Así me entretengo cuando estoy aburrido,
cuando nadie me mira, cuando espero
impaciente el menú del restaurante.
Algunos tienen nombre propio, bichos
que apenas sobreviven en el trazo, en
la corta vida que el papel les concede.
Ellos me acompañan. Llaman a la puerta
a cualquier hora, y yo siempre los recibo.
Llevo a todas partes una pluma, no vaya
a ser que los escuche y no tenga cómo
darles forma. Nunca piden nada a cambio.
Ellos bailan felices en manteles, boletos,
servilletas, y luego –así como han llegado–
se despiden. La gente cree que la pluma
es para anotar versos, apuntes misteriosos
que se le ocurren al poeta. No sabe que
nunca escribo apuntes, que los monigotes
me visitan cuando suena la música
del mundo. Y yo no puedo escucharla.
(Trad.: Ellen Maria Vasconcellos)
Eduardo
Chirinos é um escritor peruano, nascido em Lima, em 1960. Entre
seus poemários, encontramos “Cuadernos
de Horacio Morell",
"Archivos
de huellas digitales",
"El
libro de los encuentros",
"El
equilibrista de Bayard Street",
“Abecedario
del agua”, “Breve historia de la música” e “No
tengo ruiseñores en el dedo.
Também
é autor de dois livros híbridos de prosa crítica, crônica e
poesia, intitulados "Epístola
a los transeúntes"
y "El
fingidor".
Eduardo
Chirinos es un escritor peruano, nacido en Lima en 1960. Entre sus
poemarios, encontramos "Cuadernos de Horacio Morell",
"Archivos de huellas digitales", "El libro de los
encuentros", "El equilibrista de Bayard Street",
“Abecedario del água”, “Breve historia de la música”
y “No tengo ruiseñores en el dedo”. Asimismo es autor de
dos libros híbridos de prosa crítica, crónica y poesía, titulados
"Epístola a los transeúntes" y "El fingidor".
Nenhum comentário:
Postar um comentário